sexta-feira, 30 de março de 2012


lua e vênus daqui do terreiro

Nem era tanto para vir aqui, o que resolvi, vim escrever do ardido nos olhos.
Meus olhos ardem, estão vermelhos e ardentes, pisco muitas vezes. As glândulas fabricam e jogam nos canais, chegam à superfície o líquido e os globos se enchem, mas nada cai, estão secos e absorvem a umidade.
As palavras me causam ardência nos olhos, ardor, ardor.
Após tantas e tantas horas que se passaram, forço, forjo uma entrada.
Miro o que há, vejo o que é e não falo nem um a, nem pra gosto ou desgosto: muda.
E os finos vasos salientes dão aquela coloração rubra ao branco, alteram o tom do castanho.
Falo da imagem que não faz parte, à parte. E a imagem sem pouso nem pose causa em e anti: patias partias parti.
Normal, pois é assim mesmo.
À força nada presta, mas para carregar uma geladeira, a força é bem vinda, ou empurrar.
Unidades de medida: de massa de peso da gravidade na lua flutua.
E paro pra sentir ardume nos olhos.
Desço as pestanas pra ouvir um som.  


O Som!!!!!!

Ney Matogrosso - Veja bem, meu bem


*** Ney Matogrosso é um delírio *** 

quarta-feira, 21 de março de 2012

Nesses primeiros meses


AGENDA COPASA 2011(risco 2012)

"Nossos dias são os dias da água.  
    Nossos caminhos são os caminhos da água.
Nosso mundo é o mundo da água."


Assim vou construindo minhas agendas.

Esta é presente que ganhei final do ano passado. Nela, a Júnia, pequena que cresce Liz, me ajudou a fazer as adaptações, riscos nos dias e atualizações, só que passou batido o fevereiro bissexto, daí, novos riscos. Não sei até que ponto os escritos coincidem com o ato.


09/01/12
A passos lentos a buscar palavras na madrugada da noite, no céu no mar, nas condensações borbulhantes. Ondas e tufos. As pedras no jardim. O canto assoviado do vento no bico dos corpos emplumados de vôo embicado, adentra onde pulsa vida: terras, encostas, barrancos, ribanceiras.

10/02/12
Hoje, mais que em qualquer outro tempo da minha caminhada, tenho com maior compreensão e mais desprendimento a capacidade de afirmar da imperfeição racional do ser humano, de nós. Vejo meu reflexo todos os dias no espelho, então não tem convenientemente e hipocritamente você, ele, elas, tem é nós, nós e nós. E como existem intrinsecamente e escolhidamente (por escolha própria) as diferenciações, tenho motivos para orgulhar e acreditar no porvir.
Na natureza as leis são imutáveis. A natureza não pensa. A natureza é perfeita e não há ser humano que mude isto.
Escolhi colocar duas crianças neste mundo, não vieram habitar meu corpo só por minha obra, mas a escolha de trazê-las foi minha – o corpo é meu, os seios são meus, e dar de mamar por quase dois anos a cada uma delas foi das melhores experimentações.

12/03/012
Hoje, desta vez, me vejo, não aquele mar imenso, mas um rio. Um riozinho, um regato, riacho que corre atrás da encosta, segmento da cachoeira que nasce lá na ponta e desce em cascata que me forma e me leva. Manso e cristalino nas estiagens, turvo e barrento nas chuvarradas.
Minhas moléculas são de beber, dizem água doce, deve de ser porque a outra é salgada, mas só água de beber já dava, só que água doce vira poesia e sigo na direção de me misturar. Vou por cima e entre as pedras grandes, médias, pedregulhos e cascalhos. Às minhas margens bois, vacas e outros animais me bebem, sugam, saciam em mim sua sede. Girinos, pequenos peixes, outros seres me habitam, uma infinidade de microorganismos, todos irracionais.
Quem são os racionais que me matam? 

sábado, 17 de março de 2012

UM SOM!!!!




Temos este cd e é um primor, uma maravilha de ouvir e deixar que o som das violas e todo ele façam sua magia de encantar. A que mais escuto é a 9, é o som que trago.






O Trenzinho do Caipira, Heitor Villa-Lobos e Ferreira Gullar - Viola Quebrada, Mário de Andrade e Heitor Villa-Lobos - Interpretação de João de Araújo e Viola Urbana, do cd Viola Urbana. Imagens do DVD Viola Urbana

sexta-feira, 9 de março de 2012

todo dia, toda hora

imagem: net


Morgana fala...
Em vida, chamaram-me de muitas coisas: irmã, amante, sacerdotisa, maga, rainha. O mundo das fadas afasta-se cada vez mais daquele em que cristo predomina. Nada tenho contra o Cristo, apenas contra os seus sacerdotes, que chama a Grande Deusa de demônio e negam o seu poder no mundo. Alegam que, no máximo, esse seu poder foi o de Satã. Ou vestem-na com o manto azul da Senhora de Nazaré – que realmente foi poderosa, ao seu modo –, que, dizem, foi sempre virgem. Mas o que pode uma virgem saber das mágoas e labutas da humanidade?
E agora que este mundo está mudado e Arthur – meu irmão, meu amante, rei que foi e rei que será – está morto (o povo diz que ele dorme) na ilha sagrada de Avalon, é preciso contar as coisas antes que os sacerdotes do Cristo Branco espalhem por toda parte os seus santos e lendas.
Pois, como disse, o próprio mundo mudou.
Houve tempo em que um viajante se tivesse disposição e conhecesse apenas uns poucos segredos, poderia levar sua barca para fora, penetrar no mar do Verão e chegar não ao Glastonbury dos monges, mas à ilha sagrada de Avalon: isso porque, em tal época, os portões entre os mundos vagavam nas brumas, e estavam abertos, um após o outro, ao capricho e desejo dos viajantes. Esse é o grande segredo, conhecido de todos os homens cultos de nossa época: pelo pensamento criamos o mundo que nos cerca, novo a cada dia.
E agora os padres, acreditando que isso interfere no poder do seu Deus, que criou o mundo de uma vez por todas, para ser imutável, fecharam os portões (que nunca foram portões, exceto na mente dos homens), e os caminhos só levam à ilha dos padres, que eles protegeram com o som dos sinos de suas igrejas, afastando todos os pensamentos de um outro mundo que viva nas trevas. Na verdade, dizem eles, se aquele mundo algum dia existiu, era propriedade de Satã, e a porta do inferno, se não o próprio inferno. Não sei o que o Deus deles pode ter criado ou não. Apesar das historias contadas, nunca soube muito sobre seus padres e jamais usei o negro de uma de suas monjas-escravas. Se os cortesãos de Arthur em Camelot fizeram de mim este juízo, quando fui lá (pois sempre usei as roupas negras da Grande Mãe em seu disfarce de maga), não os desiludi.
E na verdade, ao final do reinado de Arthur, teria sido perigoso agir assim, e inclinei a cabeça à conveniência, como nunca teria feito a minha grande Senhora, Viviane, Senhora do Lago, que depois de mim foi a maior amiga de Arthur, para se transformar mais tarde em sua maior inimiga, também depois de mim.
A luta, porém, terminou. Pude finalmente saudar Arthur, em sua agonia, não como meu inimigo e o inimigo de minha Deusa, mas apenas como meu irmão, e como um homem que ia morrer e precisava da ajuda da mãe, para a qual todos os homens finalmente se voltam. Até mesmo os sacerdotes sabem disso, com sua Maria sempre-virgem em seu manto azul, pois ela, na hora da morte, também se transforma na Mãe do Mundo.
E assim, Arthur jazia enfim com a cabeça em meu colo, vendo-me não como irmã, amante ou inimiga, mas apenas como maga, sacerdotisa, Senhora do Lago; descansou, portanto no peito da Grande Mãe, de onde nasceu, e para quem, como todos os homens, tem a finalidade de voltar. E talvez – enquanto eu guiava a barca que o levava, desta vez não para a ilha dos padres, mas para a verdadeira ilha sagrada no mundo das trevas que fica além do nosso, para a ilha de Avalon, aonde, agora, poucos, além de mim, poderiam ir – ele estivesse arrependido da inimizade surgida entre nós.(...)
A verdade tem muitas faces e assemelha-se à velha estrada que conduz a Avalon: o lugar para onde o caminho nos levará depende da nossa própria vontade e de nossos pensamentos, e, talvez, no fim, chegaremos ou à sagrada ilha da eternidade, ou aos padres, com seus sinos, sua morte, seu Satã e Inferno e danação...Mas talvez eu seja injusta com eles. Até mesmo a Senhora do Lago, que odiava a batina do padre tanto quanto teria odiado a serpente venenosa, e com boas razões, censurou-me certa vez por falar mal do deus deles.
“Todos os deuses são um deus”, disse ela, então como já dissera muitas vezes antes, e como eu repeti para as minhas noviças inúmeras vezes, e como toda sacerdotisa, depois de mim, há de dizer novamente, “e todas as deusas são uma deusa, e há apenas um iniciador. E cada homem a sua verdade, e Deus com ela”.
Assim, talvez a verdade se situe em algum ponto entre o caminho para Glastonbury, a ilha dos padres, e o caminho de Avalon, perdido para sempre nas brumas do mar do Verão.
Mas esta é a minha verdade; eu, que sou Morgana, conto-vos estas coisas, Morgana que em tempos mais recentes foi chamada Morgana, a Fada.
Marion Zimmer Bradley, in As Brumas de Avalon



imagem:net

segunda-feira, 5 de março de 2012

outra vez

DONA COISA E SEUS DOIS PARTIDOS

Vivia Dona Coisa a procurar um marido. Quando numa estação,
poderia ter sido inverno ou verão, enamora-se pelo Seu Trem.
Viviam a viajar por tudo quanto era lugar. 

Numa dessas, oh, tragédia!
Aconteceu do Seu Trem descarrilar e capotar seus filhos vagões.
Morre Seu Trem. Vira fantasma. Dona Coisa fica inconsolada.
Passadas as cerimônias fúnebres, bate-lhe à porta o Dr. Negócio,
responsável pelos interesses do finado fantasma.
Fagulhas elétricas passam da Coisa para o Negócio...
Encontros, testamentos, heranças, abundanças.
Interessa-se o Doutor...
Foi no que deu
E toda vez que o Dr. Negócio negociava com D. Coisa ouvia-se:
Café-com-pão
Café-com-pão
Café-com-pão
E o leite na chaleira:
Piuiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii!
(D-97)

sexta-feira, 2 de março de 2012

Manoel de Barros e outras coisas


Uso um deformante para a voz.
Em mim funciona um forte encanto a tontos.
Sou capaz de inventar uma tarde a partir de uma garça.
Sou capaz de inventar um lagarto a partir de uma pedra.
Tenho um senso apurado de irresponsabilidades.
Não sei de tudo quase sempre quanto nunca.
Experimento o gozo de criar.
Experimento o gozo de Deus.
Faço vaginação com palavras até meu retrato aparecer.
Apareço de costas.
Preciso de atingir a escuridão com clareza.
Tenho de laspear verbo por verbo até alcançar o meu aspro.
Palavras têm que adoecer de mim para que se tornem mais saudáveis.
Vou sendo incorporado pelas formas pelos cheiros pelos sons pelas cores.
Deambulo aos esgarços.
Vou deixando pedaços de mim no cisco.
O cisco tem agora para mim a importância de Catedral.


MANOEL DE BARROS




*♥*♥*♥*♥*♥*♥*


Volto ao passado, às aventuras, às tentativas de fazer das minhas capacidades manuais um sustento que substituísse aquelas outras de onde tirava, vinha minha subsistência, nunca consegui ir adiante. Hoje tenho clareza do porque. Foram as pinturas em camisetas, pinturas em objetos dos mais variados em cerâmica e gesso, as caixinhas de madeira, teve a feitura/costura de bolsas, bordados, coisas que fazia com canudos de jornal e por aí ia e ainda vou. Numa destas, comprei uns tantos metros de etamine, não a branca, que estava em promoção, era pra acabar, levei toda a metragem. A intenção era fazer aqueles suportes para colocar à mesa nas refeições, o tal ‘jogo americano’, e nem sei porque tem este nome.


Tenho uma sacola cheia de revistas, daquelas faça você mesmo, ensinando pinturas em tecidos dos mais diversos, camisetas, jeans, pano de prato, seda, pintura em madeira, técnicas das mais variadas, tintas de tudo quanto é tipo, trabalhos com jornal, com canos de papelão, revistas ensinando bordados com pedrarias, miçangas, lantejoulas, fuxicos, revistas de costura, bonecas, bolsas, biscuit, uma misturança de artes e artesanatos que incluem os moldes e riscos.


Dou continuidade ao caso da etamine. Pois bem, cortei dois pedaços, retangulados com as pontas arredondadas, para fazer os tais suportes e escolhi uma das revistas com motivos de facas, garfos, colheres, coisas de uma cozinha. Transferi o risco de umas facas, umas colheres e uns garfos dispostos, não aleatoriamente, pelo tecido, peguei as tintas, usaria as mesmas cores da revista.


A nossa relação com as cores é algo tão forte, nos ligamos aos tons de forma bem profunda. São as cores das bandeiras, de nossas vestimentas, as usadas em terapias, cores das situações, dos sentidos e significados que as atribuímos. Penso nas relações também feitas com os animais e fico triste pelo tucano, ave tão bonita e colorida que nada sabe e é esculhambado por representar um partido de degradações, é um sacrilégio.


Mas, voltando. Peguei um dos retângulos arredondados e comecei a pintar, então foi que reparei nas cores escolhidas pela revista, azul, vermelho e branco e me veio uma bandeira de um certo país. A bandeira dos Estados Unidos, senti um arrepio. Não troquei as tintas, continuaria naquelas cores, só que do meu jeito. Depois de pintados os talheres não me dei por satisfeita, fui e fiz listras negras por cima. 
Uma pessoa vendo aquilo perguntou – Delvais, você acha que alguém vai comprar isto e colocar à mesa? E eu – Não sei, eu compraria. O trem já tinha descambado. Não fiz o acabamento em volta e usei durante muito tempo de forro para uma pasta.
 


O outro já estava com os riscos passados, peguei mais potinhos com tintas de cores variadas e fui pintando. Saiu isto:
Depois de recortado grudei atrás para dar firmeza um emborrachado, e v a, virou quadro.
E o resto da etamine, virou um pano pintado que teve algumas utilidades, hoje fica mais guardado de lembrança, pois está com uns esgarços que foram remendados com fita adesiva transparente.

A tormenta que se tornou

A vontade é ir preenchendo as tantas linhas vazias com toda manifestação das emoções que se dão, afloram e transpiram, ocupando de rab...